Tragédias coletivas




A dolorosa ocorrência do dia 11 de Setembro de 2001, que causou a morte de milhares de pessoas, traz novamente, de forma mais intensa e angustiosa a pergunta: por quê? Por que acontecem essas tragédias coletivas? Outras indagações acorrem à mente: por que alguns foram salvos, desistindo ir trabalhar naquele dia ou chegando atrasado? Por que alguns foram poupados e outros não?


Somente o Espiritismo tem as respostas lógicas, profundas e claras que explicam, esclarecem e, por via de conseqüência, consolam os corações humanos. Para a imensa maioria das criaturas essas provas coletivas constituem um enigma insolúvel, pois desconhecem os mecanismos da Justiça Divina, que traz no seu âmago a lei de causa e efeito. Ante tragédias como essa mais recente, ou como outras de triste memória; diante desses dramáticos episódios a fé arrefece, torna-se vacilante e, não raro, surge a revolta, o desespero, a descrença. Menciona-se que Deus castiga violentamente ou que pouco se importa com os sofrimentos da Humanidade. Chega-se ao ponto de comparar-se o Criador a um pai terreno e, nesse confronto, este sair ganhando, pois zela pelos seus filhos e quer o melhor para eles, enquanto que Deus...


Allan Kardec, o Codificador do Espiritismo, interrogou os Espíritos Superiores quanto às provas coletivas, no item intitulado Flagelos Destruidores, conforme vemos em "O Livro dos Espíritos", nas questões 737 a 741. Nos últimos tempos a Espiritualidade Amiga tem-se pronunciado a respeito das provações coletivas, conforme comentaremos a seguir, com alguns exemplos.


Exatamente no dia 17 de dezembro de 1961, em Niterói (RJ), ocorre espantosa tragédia em um circo apinhado de crianças e adultos que procuravam passar uma tarde alegre, envolvidos pela magia dos palhaços, trapezistas, malabaristas e domadores com os animais. Subitamente irrompe um incêndio que atinge proporções devastadoras em poucos minutos, ferindo e matando centenas de pessoas, queimadas, asfixiadas pela fumaça ou pisoteadas pela multidão em desespero. Essa dramática ocorrência, que comoveu o povo brasileiro, motivou a Espiritualidade Maior a trazer minucioso esclarecimento, conforme narrativa do Espírito Humberto de Campos, inserida no livro "Cartas e Crônicas" (ed. FEB), cap. 6.


Narra o querido cronista espiritual que no ano de 177, em Lião, no sopé de uma encosta, mais tarde conhecida como colina de Fourvière, improvisara-se grande circo, com altas paliçadas em torno de enorme arena. Era a época do imperador Marco Aurélio, que se omitia quanto às perseguições que eram infligidas aos cristãos. Por isto a matança destes era constante e terrível. Já não bastava que fossem os adeptos do Nazareno jogados às feras para serem estraçalhados. Inventavam-se novos suplícios. Mais de vinte mil pessoas haviam sido mortas. Anunciava-se para o dia seguinte a chegada de Lúcio Galo, famoso cabo de guerra, que desfrutava atenções especiais do Imperador. As comemorações para recebê-lo deveriam, portanto, exceder a tudo o que já se vira. Foi providenciada uma reunião para programação dos festejos. Gladiadores, dançarinas, jograis, lutadores e atletas diversos estariam presentes. Foi quando uma voz lembrou: - "Cristãos às feras!" Todos aplaudiram a idéia, mas logo surgiram comentários de que isto já não era novidade. Em consideração ao visitante era preciso algo diferente. Assim, foi planejado que a arena seria molhada com resinas e cercada de farpas embebidas em óleo, sendo reunidas ali cerca de mil crianças e mulheres cristãs. Seriam ainda colocados velhos cavalos e ateado fogo. Todos gargalhavam imaginando a cena. O plano foi posto em ação. E no dia seguinte, conforme narra Humberto de Campos, ao sol vivo da tarde, largas filas de mulheres e criancinhas, em gritos e lágrimas, encontraram a morte, queimadas ou pisoteadas pelos cavalos em correria. Afirma o cronista espiritual que quase dezoito séculos depois, a Justiça da Lei, através da reencarnação, reaproximou os responsáveis em dolorosa expiação na tragédia do circo, em Niterói.


Uma outra tragédia também mereceu dos Benfeitores Espirituais vários esclarecimentos. Por ocasião do incêndio do Edifício Joelma, em São Paulo, ocorrido no dia lº de fevereiro de 1974, o médium Francisco Cândido Xavier, em seu lar, em Uberaba (MG), ouvindo a notícia pelo rádio, reuniu-se em prece com quatro amigos, solicitando auxílio dos Benfeitores Espirituais para as vítimas. Atendendo ao apelo apresenta-se o Mentor Espiritual Emmanuel e escreve, através do médium, comovedora prece inserida no livro "Diálogo dos Vivos".


Dias depois, em reunião pública, na qual estavam presentes alguns familiares de vítimas do incêndio do Joelma, os poetas Cyro Costa e Cornélio Pires (Espíritos) manifestaram-se pela psicografia, ditando ao médium sonetos referentes à tragédia. O soneto de Cyro Costa traz uma dedicatória e transcrevemos, tal como está, no citado livro "Diálogo dos Vivos" (cap. 26, pág. 150):


“Deus não castiga ninguém. Admitindo que já vivemos antes, fica mais fácil compreender. Não ensinou o Cristo que quem com ferro fere, com ferro será ferido? Que todo homem será punido naquilo em que pecar? Dentro desse raciocínio legitimamente cristão, quem, em conjunto com outras pessoas, agrediu o próximo não teria que pagar em conjunto?”


É esse o chamado “carma coletivo”. Toda ação que praticamos, boa ou má, recebemos de volta. Nosso passado determina nosso presente, não existindo, pois, favoritismos, predestinações ou arbítrios divinos. O homem é o árbitro do seu destino, subordinado ao determinismo cósmico, essencialmente complacente e progressivo, transcendendo o espaço e o tempo.


Na provação coletiva, morte de muitos, em situações iguais, verifica-se a convocação dos espíritos encarnados, participantes do mesmo débito relacionado ao passado delituoso e obscuro. A história da civilização é um relato de crimes, violências e absurdos e lá estivemos juntos, “aprontando”... As Cruzadas, a inquisição, as injustiças de todas as guerras... Só se livra das dívidas, quitando-as. Quem não deve não paga. É por isso que muitos perdem o avião que se acidentaria dali a pouco, enquanto outros nele viajam inesperadamente. É lógico que quem escapou não fazia parte do grupo de devedores. E, como o espírito é imortal, deixando o corpo, ele parte para novas experiências, no aprendizado em direção à felicidade verdadeira e definitiva.