A Transição - Parte 2 de 4


Estabeleçamos, em primeiro lugar, e como princípio, os quatro seguintes casos, que podemos encarar como situações extremas dentro de cujos limites há uma infinidade de variantes:


1° - Se no momento em que se extingue a vida orgânica o desprendimento do perispírito fosse completo, a alma nada sentiria absolutamente;


2° - Se nesse momento a união dos dois elementos estiver no auge de sua força, produz-se uma espécie de ruptura;


3° - Se a coesão for fraca, a separação torna-se fácil e opera-se sem abalo;


4° - Se após a cessação completa da vida orgânica existirem ainda numerosos pontos de contato entre o corpo e o perispírito, a alma poderá sentir os efeitos da decomposição do corpo, até que o laço inteiramente se desfaça.


Daí resulta que o sofrimento que acompanha a morte está subordinado à força adesiva que une o corpo ao perispírito e que tudo o que puder atenuar essa força, facilitar a diminuição desse estado, e acelerar a rapidez do desprendimento, torna a passagem menos penosa; e, finalmente, que, se o desprendimento se operar sem nenhuma dificuldade, a alma deixará de experimentar qualquer sentimento desagradável.


Na transição da vida corporal para a espiritual produz-se ainda um outro fenômeno de importância capital – a perturbação. Nesse instante a alma experimenta um entorpecimento que paralisa momentaneamente as suas faculdades, neutralizando, ao menos em parte, as suas sensações. É como se ficasse, por assim dizer, em um estado de catalepsia, de modo que a alma quase nunca testemunha conscientemente o derradeiro suspiro. Dizemos quase nunca porque há casos em que a alma pode contemplar conscientemente o desprendimento.


A perturbação pode, pois, ser considerada como um fato normal no instante da morte, podendo perdurar por tempo indeterminado, variando de algumas horas a alguns anos. À proporção que se liberta, a alma encontra-se numa situação comparável à de um homem que desperta de um profundo sono: as ideias são confusas, vagas, incertas; a visão apenas distingue como que através de um nevoeiro, mas pouco a pouco se aclara, desperta-se-lhe a memória e o conhecimento de si mesmo. Mas isso de acordo com as situações individuais. Para uns esse despertar é calmo e proporciona uma sensação deliciosa, mas, para outros, é bem diferente, cheio de terror e angústia, semelhante a horrendo pesadelo.


O momento do último suspiro quase nunca é o mais doloroso, uma vez que ordinariamente ocorre em um momento de inconsciência e em geral a alma não chega a percebê-lo. Mas a alma sofre antes dele a desagregação da matéria, durante as convulsões da agonia, e, depois, as angústias da perturbação. Demo-nos pressa em afirmar que esse estado não é generalizado, porquanto a intensidade e duração do sofrimento estão na razão direta da afinidade existente entre corpo e perispírito. Assim, quanto maior for essa afinidade, tanto mais penosos e prolongados serão os esforços da alma para desprender-se. Há pessoas nas quais a união é tão fraca que o desprendimento se opera por si mesmo, como que naturalmente, sem dificuldades; é como se um fruto maduro se desprendesse do seu caule. É o caso das mortes calmas, de pacífico despertar.


A causa principal da maior ou menor facilidade de desprendimento é o estado moral da alma. A afinidade entre o corpo e o perispírito é proporcional ao apego à matéria, que atinge o seu máximo no homem cujas preocupações dizem respeito exclusiva e unicamente à vida e aos gozos materiais. Ao contrário, nas almas puras, que antecipadamente se identificam com a vida espiritual, o apego é quase nulo. E desde que a lentidão e a dificuldade do desprendimento estão na razão do grau de pureza e desmaterialização da alma, de nós somente depende o tornar fácil ou penoso, agradável ou doloroso, esse desprendimento.


Posto isto, quer como teoria, quer como resultado de observações, resta-nos examinar a influência do gênero de morte sobre as sensações da alma nos últimos transes.


- Texto retirado do livro “O Céu e o Inferno” - Allan Kardec / 2ª Parte - Cap. I

- Nota do blog Espírita na Net – Edição realizada dos textos retirados do livro “O Céu e o Inferno”, das editoras FEB (40ª Edição) e LAKE (12ª Edição - Com tradução de J. Herculano Pires).


A Transição - Parte 1 de 4



A confiança na existência da vida futura não exclui as apreensões quanto à passagem desta para a outra vida. Há muita gente que teme não a morte, em si, mas o momento da transição. Sofremos ou não nessa passagem? Por isso se inquietam, e com razão, visto que ninguém pode escapar a esse momento. Podemos dispensar-nos de qualquer viagem neste mundo, menos essa. Ricos e pobres, devem todos fazê-la, e, se ela for dolorosa, nem posição nem fortuna poderiam suavizá-la.


Vendo-se a calma de alguns moribundos e as convulsões terríveis da agonia de outros, pode-se previamente julgar que as sensações experimentadas nem sempre são as mesmas. Quem poderá, no entanto, esclarecer-nos a tal respeito? Quem nos descreverá o fenômeno fisiológico da separação entre a alma e o corpo? Quem nos contará as impressões desse instante supremo, quando a Ciência e a Religião se calam? E calam-se porque lhes falta o conhecimento das leis que regem as relações do Espírito e da matéria, parando uma nos limites da vida espiritual e a outra nos da vida material. O Espiritismo é o traço de união entre as duas, e só ele pode dizer-nos como se opera a transição, quer pelas noções positivas que oferece sobre a natureza da alma, quer pela descrição dada pelos que deixaram este mundo. O conhecimento do laço fluídico que une a alma ao corpo é a chave desse e de muitos outros fenômenos.


A insensibilidade da matéria inerte é um fato positivo. Só a alma experimenta sensações de dor e de prazer. Durante a vida, toda a desagregação material repercute na alma, que por este motivo recebe uma impressão mais ou menos dolorosa. É a alma e não o corpo quem sofre, pois este é apenas o instrumento da dor e a alma é o paciente. Após a morte, estando separada a alma, o corpo pode ser livremente mutilado que nada sentirá. A alma, estando isolada do corpo, nada experimenta da destruição orgânica. A alma tem sensações próprias, cuja fonte não reside na matéria tangível.


O perispírito é o envoltório físico da alma e não se separa dela nem antes nem depois da morte, e com a qual se pode dizer que forma um todo, e não se pode conceber uma sem outro. Durante a vida o fluido perispirítico penetra o corpo, impregnando-o em todas as suas partes, e serve de veículo às sensações físicas da alma, do mesmo modo como esta, por seu intermédio, atua sobre o corpo e dirige-lhe os movimentos. (1)


A extinção da vida orgânica acarreta a separação da alma em consequência do rompimento do laço fluídico que a une ao corpo, mas essa separação nunca é brusca. O fluido perispiritual só pouco a pouco se desprende de todos os órgãos, de maneira que a separação só é completa e absoluta quando não reste mais um único átomo do perispírito ligado a uma molécula do corpo. A sensação dolorosa que a alma experimenta, por ocasião da morte, está na razão direta da quantidade dos pontos de contato existentes entre o corpo e o perispírito, determinando a maior ou menor dificuldade ou lentidão que apresenta o rompimento. Não é preciso, portanto, dizer que, conforme as circunstâncias, a morte pode ser mais ou menos penosa. Estas circunstâncias é que nos cumpre examinar.


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(1) Em pesquisas realizadas a partir de 1965 os físicos e biólogos soviéticos conseguiram obter provas concretas (fotografias e visão através de aparelhos óticos especiais) da existênica do perispírito, a que deram o nome de corpo bioplástico. (Nota do Tradutor – Herculano Pires)



- Texto retirado do livro “O Céu e o Inferno” - Allan Kardec / 2ª Parte - Cap. I

- Nota do blog Espírita na Net – Edição de textos retirados do livro “O Céu e o Inferno” pelas editoras FEB (40ª Edição) e LAKE (12ª Edição - Com tradução de J. Herculano Pires).


MATURIDADE




Se já prestamos serviço sem perguntar se a criatura está precisando...


Se já auxiliamos nas boas obras sem aguardar recompensa...


Se procuramos o trabalho que nos compete sem rogar que outros nos substituam nas próprias obrigações...


Se não registramos ressentimentos...


Se cooperamos espontaneamente em favor do próximo...


Se buscamos a própria renovação sem esperar que os outros bitolem emoções e ideias pelo nosso coração ou pela nossa cabeça...


Se estudamos os problemas da existência e da alma sem que ninguém nos obrigue a isso...


Se amamos sem cogitar se os outros nos amam...


Se reconhecemos que a nossa liberdade unicamente é válida pelo dever que cumprimos...


Se já sabemos esquecer o mal, para valorizar o bem...


Se já conseguimos calar todos os assuntos que induzam à intranquilidade e ao pessimismo...


Então estaremos atingindo as faixas benditas da maturidade com a Via Superior.


Pelo Espírito Albino Teixeira

De "Aulas da Vida" - Francisco C. Xavier


TRISTEZA



Não permitamos que a tristeza nos envolva e nos mergulhe na depressão.


A apatia é abismo profundo do qual sairemos apenas à custa de muito esforço.


Não nos entreguemos , inermes, aos problemas que nos rodeiam, ensimesmados na tristeza.


Os que se rendem ao desânimo transformam-se em pacientes psiquiátricos, vitimados por estranha anemia de ordem moral.


Quando sentirmos que a tristeza insiste em se demorar conosco, ocupemos as nossas mãos e a nossa mente no serviço do bem.


Deixemos a poltrona do comodismo e desintoxiquemo-nos no suor da caridade.


Se abatidos espiritualmente no reconhecimento das próprias imperfeições, sintamo-nos incentivados à luta, ao invés de admitirmos a derrota.


Reajamos contra a melancolia, sacudindo o seu jugo de nossos ombros.


Reparemos que em nossos caminhos, de fato “as bênçãos são muito mais numerosas do que as dores”.


Observemos os exemplos de quantos se encontram lutando com limitações maiores que as nossas, sem que lhes escutemos uma reclamação sequer.


No livro dos Provérbios, cap. 17, v. 22, está escrito: “O coração alegre é como o bom remédio, mas o espírito abatido seca até os ossos”.


(Carlos A. Baccelli - Por Irmão José - In: Lições da Vida)



PERDÃO



Perdoar e não perdoar significa absolver e condenar?


Emmanuel - Nas mais expressivas lições de Jesus, não existem, propriamente, as condenações implícitas ao sofrimento eterno, como quiseram os inventores de um inferno mitológico.


Os ensinos evangélicos referem-se ao perdão ou à sua ausência.


Que se faz ao mal devedor a quem já se tolerou muitas vezes? Não havendo mais solução para as dívidas que se multiplicam, esse homem é obrigado a pagar.


É que se verifica com as almas humanas, cujos débitos, no tribunal da justiça divina, são resgatados nas reencarnações, de cujo círculo vicioso poderão afastar-se, cedo ou tarde, pelo esforço no trabalho e boa-vontade no pagamento.


Na lei divina, há perdão sem arrependimento?


Emmanuel - A lei divina é uma só, isto é, a do amor que abrange todas as coisas e todas as criaturas do Universo ilimitado.


A concessão paternal de Deus, no que se refere à reencarnação para a sagrada oportunidade de uma nova experiência, já significa, em si, o perdão ou a magnanimidade da Lei. Todavia, essa oportunidade só é concedida quando o Espírito deseja regenerar-se e renovar seus valores íntimos pelo esforço nos trabalhos santificantes.


Eis por que a boa-vontade de cada um é sempre o arrependimento que a Providência Divina aproveita em favor do aperfeiçoamento individual e coletivo, na marcha dos seres para as culminâncias da evolução espiritual.


Antes de perdoarmos a alguém, é conveniente o esclarecimento do erro?


Emmanuel - Quem perdoa sinceramente, fá-lo sem condições e olvida a falta no mais íntimo do coração; todavia, a boa palavra é sempre útil e a ponderação fraterna é sempre um elemento de luz, clarificando o caminho das almas.


Quando alguém perdoa, deverá mostrar a superioridade de seus sentimentos para que o culpado seja levado a arrepender-se da falta cometida?


Emmanuel - O perdão sincero é filho espontâneo do amor e, como tal, não exige reconhecimento de qualquer natureza.


O culpado arrependido pode receber da justiça divina o direito de não passar por determinadas provas?


Emmanuel - A oportunidade de resgatar a culpa já constitui em si mesma, um ato de misericórdia divina, e, daí, o considerarmos o trabalho e o esforço próprio como a luz maravilhosa da vida.


Estendendo, todavia, a questão à generalidade das provas, devemos concluir ainda, com o ensinamento de Jesus, que “o amor cobre a multidão dos pecados”, traçando a linha reta da vida para as criaturas e representando a única força que anula as exigências da lei de talião, dentro do Universo infinito.


– “Concilia-te depressa com o teu adversário” – Essa é a palavra do Evangelho, mas se o adversário não estiver de acordo como bom desejo de fraternidade, como efetuar semelhante conciliação?


Emmanuel - Cumpra cada qual o seu dever evangélico, buscando o adversário para a reconciliação precisa, olvidando a ofensa recebida. Perseverando a atitude rancorosa daquele, seja a questão esquecida pela fraternidade sincera, porque o propósito de represália, em si mesmo, já constitui numa chaga viva para quantos o conservam no coração.


Por que teria Jesus aconselhado perdoar “setenta vezes sete?”.


Emmanuel - A Terra é um plano de experiências e resgates por vezes bastante penosos, e aquele que se sinta ofendido por alguém, não deve esquecer que ele próprio pode também errar setenta vezes sete.


Em se falando de perdão, poderemos ser esclarecidos quanto à natureza do ódio?


Emmanuel - O ódio pode traduzir-se nas chamadas aversões instintivas, dentro das quais há muito de animalidade, que cada homem alijará de si, com os valores da auto-educação, a fim de que o seu entendimento seja elevado a uma condição superior.


Todavia, na maior parte das vezes, o ódio é o gérmem do amor que foi sufocado e desvirtuado por um coração sem Evangelho. As grandes expressões afetivas convertidas nas paixões desorientadas, sem compreensão legítima do amor sublime, incendeiam-se no íntimo, por vezes, no instante das tempestades morais da vida, deixando atrás de si as expressões amargas do ódio, como carvões que enegrecem a alma.


Só a evangelização do homem espiritual poderá conduzir as criaturas a um plano superior de compreensão, de modo a que jamais as energias afetivas se convertam em forças destruidoras do coração.


Perdão e esquecimento devem significar a mesma coisa?


Emmanuel - Para a convenção do mundo, o perdão significa renunciar à vingança, sem que o ofendido precise olvidar plenamente a falta do seu irmão; entretanto, para o espírito evangelizado, perdão e esquecimento devem caminhar juntos, embora prevaleça para todos os instantes da existência a necessidade de oração e vigilância.


Aliás, a própria lei da reencarnação nos ensina que só o esquecimento do passado pode preparar a alvorada da redenção.


Os Espíritos de nossa convivência, na Terra, e que partem para o Além, sem experimentar a luz do perdão, podem sofrer com as nossas opiniões acusatórias, relativamente aos atos de sua vida?


Emmanuel - A entidade desencarnada, muito sofre com o juízo ingrato ou precipitado que, a seu respeito, se formula no mundo.


Imaginai-vos recebendo o julgamento de um irmão de humanidade e avaliai como desejaríeis a lembrança daquilo que possuís de bom, a fim de que o mal não prevaleça em vossa estrada, sufocando-vos as melhores esperanças de regeneração.


Em lembrando aquele que vos precedeu no túmulo, tende compaixão dos que erraram e sede fraternos.


Rememorar o bem é dar vida à felicidade. Esquecer o erro é exterminar o mal. Além de tudo, não devemos esquecer de que seremos julgados pela mesma medida com que julgarmos.



Do livro “O Consolador” - Pelo Espírito Emmanuel - Psicografia: Francisco Cândido Xavier (Terceira Parte – Item III – Questões 332 a 341)


A Doutrinação - Parte 4/4




Todos os Espíritos, ao passarem pela morte, têm o dever de reintegrar-se na posse de sua consciência e dos seus deveres. Gozando do seu livre-arbítrio, apegados a condições que lhe parecem favoráveis para viverem à vontade, entregam- se a ilusões que devem ser desfeitas pela doutrinação. É para isso que são levados às sessões, e não para serem acocados em suas fantasias. Os Espíritos que os protegem recorrem ao ambiente mediúnico para que eles possam ser mais facilmente chamados à realidade, graças às condições humanas em que mergulham no fluido mediúnico das sessões. Tratados com amor e compreensão, esses Espíritos logo percebem a presença de entidades que na verdade já os socorriam e os levaram à sessão para facilitarem a sua percepção do socorro espiritual. Ninguém fica ao desamparo depois da morte.

Não estamos na vida para sofrer, mas para aprender. Cada dificuldade que nos desafia é uma experiência de aprendizado. O sofrimento é consequência da nossa incompreensão da finalidade da vida. Desenvolvendo a razão no plano humano, o ser se envaidece com a sua capacidade de julgar e comete os erros da arrogância, da prepotência, da vaidade, da insolência. Julga-se mais dotado que os outros e com mais direitos que eles. Essa é a fonte de todos os males humanos.

A doutrinação espírita, equilibrada, amorosa, modifica a nós mesmos e aos outros, abre as mentes para a percepção da realidade real que nos escapa, quando nos apegamos à ilusão das nossas pretensões individuais, geralmente mesquinhas. Foi isso o que Jesus ensinou ao dizer: “Os que se apegam à sua vida perdê-la-ão, mas os que a perderam por amor a mim, esses a encontrarão”.


A meditação sincera e desinteressada sobre essas coisas é o caminho da nossa libertação e da libertação dos outros. Só aquele que está livre pode libertar.


Este é um problema em que precisamos pensar, meditar a sério e a fundo para podermos adquirir a condição de doutrinar com eficiência, dando amor, compreensão e estímulo moral aos Espíritos inferiores. O Espiritismo, como acentuou Kardec, é uma questão de fundo e não de forma.


Do livro “Obsessão, o passe, a doutrinação”

J. Herculano Pires - Editora Paidéia


A Doutrinação - Parte 3/4



A psicologia da doutrinação


O doutrinador deve ler e reler, com atenção e persistência, a Escala Espírita (O Livro dos Espíritos) para bem informar-se dos tipos de Espíritos com que vai defrontar-se nas sessões. A escala nos oferece um quadro psicológico da evolução espiritual, que podemos também aplicar aos encarnados.


No trato com os Espíritos o conhecimento desse quadro facilita grandemente a doutrinação. Os Espíritos inferiores usam geralmente de artimanhas para nos iludirem e se divertem quando conseguem, prejudicando-se a si mesmos e fazendo-nos perder tempo. Temos de encará-los sempre como necessitados e tratá-los com o desejo real de socorrê-los. Mas precisamos de psicologia para conseguirmos ajudá-los. A tipologia que a escala nos oferece é de grande valia nesse sentido. Por outro lado, a leitura dos casos de doutrinação relatados por Kardec na Revista Espírita nos oferece exemplos valiosos de como podemos nos conduzir, auxiliados pelos espíritos protetores da sessão, para atingirmos bons resultados.


A prática da doutrinação é uma arte, em que o bom doutrinador vai se aprimorando na medida em que se esforça para dominá-la. Enganam-se os que pensam que basta dizer aos Espíritos que eles já morreram para os sensibilizar. Não basta, também, citar-lhes trechos evangélicos ou fazê-los orar repetindo a nossa prece.


É importante também explicar-lhes que se encontram em situação perigosa, ameaçados por Espíritos malfeitores que podem dominá-los e submetê-los aos seus caprichos. A ameaça de perda da liberdade os amedronta e os leva geralmente a buscar melhor compreensão da situação em que se encontram. Mas não se deve falar disso em tom de ameaça e sim de explicação pura e simples.


Muitos deles já estão dominados por Espíritos maldosos, servindo-lhes de instrumentos mais ou menos inconscientes. O médium que recebe a entidade sente as suas vibrações, percebe o seu estado e pode ajudar o doutrinador, procurando absorver os seus ensinos. Através da compreensão do médium o Espírito sofredor ou obsessor é mais facilmente tocado em seu íntimo e desperta para uma visão mais real da sua própria situação. Doutrinador e médium formam um conjunto que, quando bem articulado, age de maneira eficiente para a entidade.


O doutrinador deve ter sempre em mente todo esse quadro, para agir de acordo com as possibilidades oferecidas pela comunicação do Espírito. Com os Espíritos rebeldes, viciados na prática do mal, só a tríplice conjugação da autoridade moral do doutrinador, do médium e do Espírito protetor poderá dar resultados positivos e quase sempre imediatos. Se o médium ou o doutrinador não dispuser dessa autoridade, o Espírito se apegará à fraqueza de um deles ou de ambos para insistir nas suas intenções inferiores. Por isso Kardec acentua a importância da moralidade na relação com os Espíritos. Essa moralidade, como já dissemos, não é formal, mas substancial, decorre das intenções e dos atos morais dos praticantes de sessões, não apenas nas sessões, mas em todos os aspectos de sua vida.


Os Espíritos sofredores são mais facilmente doutrinados, pois a própria situação em que se encontram favorece a doutrinação. Se muito erraram na vida terrena, permanecendo por isso em situação inferior, o fato de não se entregarem à obsessão depois da morte já mostra que estão dispostos a regenerar-se.


As manifestações de Espíritos recém-desencarnados ocorrem com frequência nas sessões destinadas ao socorro espiritual. Revelam logo seu estado de angústia ou confusão, sendo facilmente identificáveis. Quando esses Espíritos se queixam de frio, pondo, às vezes, o médium a tremer, com mãos geladas, é porque estão ligados mentalmente ao cadáver. Se o doutrinador lhes disser cruamente que morreram ficam mais assustados e confusos. É necessário cortar a ligação negativa, desviando-lhes a atenção para o campo espiritual, fazendo-os pensar em Jesus e pedir o socorro do seu Espírito protetor. Trata-se a entidade como se ela estivesse doente e não desencarnada. Muda-se a situação mental e emocional, favorecendo a sua percepção dos Espíritos bons que a cercam, em poucos instantes a própria entidade percebe que já passou pela morte e que está amparada por familiares e Espíritos que procuram ajudá-la.


Só a prática abnegada da doutrinação, com o desejo profundo de servir aos que necessitam, dará ao médium e ao doutrinador a sensibilidade necessária para distinguir, rapidamente, o tipo de espírito com que se defrontam. O doutrinador intuitivo aprimora rapidamente a sua intuição, podendo perceber, logo no primeiro contato, a condição do Espírito comunicante.


A psicologia da doutrinação não tem regras específicas, dependendo mais da sensibilidade do doutrinador, que deverá desenvolvê- la na prática constante e regular. Mesmo que o doutrinador seja vidente, não deve confiar apenas no que vê, pois há Espíritos maus e inteligentes que podem simular aparências enganadoras, que a percepção psicológica apurada na prática facilmente desfará. Não é preciso ser psicólogo para doutrinar com eficiência, mas é indispensável conhecer a Escala Espírita, que nos dá o conhecimento básico indispensável.


Do livro “Obsessão, o passe, a doutrinação”

J. Herculano Pires - Editora Paidéia


A Doutrinação - Parte 2/4


A postura do doutrinador


Orgulhoso e inútil, e até mesmo prejudicial, será o doutrinador que se julgar capaz de doutrinar por si mesmo. Sua eficiência depende sempre de sua humildade, que lhe permite compreender a necessidade de ser auxiliado pelos Espíritos bons. O doutrinador que não compreende esse princípio precisa de doutrinação e esclarecimento para alijar de seu espírito a vaidade e a pretensão. Só pode realmente doutrinar Espíritos quem tiver amor e humildade.


Mas é importante não confundirmos humildade com atitudes piegas, com melosidade. Muitas vezes a doutrinação exige atitudes enérgicas, não ofensivas ou agressivas, mas firmes e imperiosas. É o momento em que o doutrinador, firmado em sua humildade natural – decorrente da consciência que tem das suas limitações humanas – trata o obsessor com autoridade moral, a única autoridade que podemos ter sobre os Espíritos inferiores. Esses Espíritos sentem a nossa autoridade e se submetem a ela, em virtude da força moral de que dispusermos. Essa autoridade só a conseguimos por meio de uma vivência digna no mundo, sendo sempre corretos em nossas intenções e em nossos atos, em todos os sentidos. As nossas falhas morais não combatidas, não controladas, diminuem a nossa autoridade sobre os obsessores. Isso nos mostra o que é a moral: poder espiritual que nasce da retidão do espírito. Não se trata da moral convencional, das regras da moral social, mas da moral individual, íntima e profunda, que realiza a integração espiritual do ser voltado para o bem e a verdade.


Mas essa integração não se consegue com sistemas ou processos artificiais, com reformas íntimas impostas de fora para dentro como geralmente se pensa. Existe a moral exógena, que nos é imposta de fora pelas conveniências da convivência humana. Essa moral exógena, pelo simples fato de se fundar em interesses imediatos do homem e não do ser é a casa construída na areia segundo a parábola evangélica. A moral de que necessitamos é endógena, vem de dentro para fora, brota da compreensão real e profunda no sentimento da vida. É a moral espontânea, determinada por uma consciência esclarecida que não se rende aos interesses imediatistas da vida social.


A doutrinação praticada com plena consciência desses princípios atinge o obsessor, o obsedado, os assistentes encarnados e desencarnados e particularmente o próprio doutrinador, que se doutrina doutrinando os outros. Note-se a importância e o alcance de uma doutrinação assim praticada. É ela a alavanca com que podemos deslocar a mente do charco de pensamentos e sentimentos inferiores, egoístas e maldosos em que se afundou. É, por isso mesmo, a alavanca com a qual podemos mover o mundo, como queria Arquimedes, para colocá-lo na órbita do Espírito. Podemos usar essa alavanca em todos os instantes: no silêncio da nossa mente, na atividade incessante do nosso pensamento, na conversação séria ou até mesmo fútil, nas relações com o próximo, nas discussões dos mais variados problemas, na exposição dos princípios doutrinários aos que desejam ouvir-nos, numa carta, num bilhete, numa saudação social – mas sempre com discrição, sem insistências perturbadoras, sem carranca e seriedade formal. O primeiro sintoma da nossa compreensão desse problema é a alegria que nos ilumina por dentro e se irradia ao nosso redor, contagiando os outros. Porque a vida é uma bênção e portanto é alegria e não tristeza, jovialidade e não carrancismo.


Do livro “Obsessão, o passe, a doutrinação”

J. Herculano Pires - Editora Paidéia


A Doutrinação - Parte 1/4



A doutrinação é a moderna técnica espírita de afastar os Espíritos obsessores por meio do esclarecimento doutrinário. Essa técnica é moderna e foi criada e desenvolvida por Allan Kardec para substituir as práticas bárbaras do exorcismo, largamente usada na Antiguidade, tanto na medicina como nas religiões.

O conceito do doente mental como possessão demoníaca gerou a ideia de espancar o doente para retirar o demônio do seu corpo. Nos hospitais a cura se processava por meio de espancamentos diários. Nas religiões recorria-se a métodos de expulsão por meio de preces, objetos sagrados como crucifixos, relíquias, rosários e terços, medalhas, aspersão de água benta, ameaças e xingos, queima de incensos e outros ingredientes, pancadas e torturas. As formas de exorcismo mais conhecidas entre nós são a judaica e a católica, sendo a judaica a mais racional, pois nela se empregavam também o apelo à razão do Dibuk, considerado como Espírito demoníaco ou alma penada. A tradução da palavra hebraica Dibuk, que nos parece mais acertada, é a de alma penada, pois os judeus reconheciam e identificavam o Espírito obsessor como espírito humano de pessoa morta que se vingava do obsedado ou cobrava débitos dele e da família. No exorcismo católico prevaleceu até hoje a ideia de possessão demoníaca.


As pesquisas espíritas, do século XIX, levaram Kardec a instituir e praticar intensivamente a doutrinação como forma persuasiva de esclarecimento do obsessor e do obsedado, em sessões de desobsessão. Ambos necessitam de esclarecimento evangélico para superarem os conflitos do passado. Afastada a ideia terrorista do diabo, obsessor e obsedado são tratados com amor e compreensão, como criaturas humanas e não como algoz satânico e vítima inocente. A doutrinação espírita humanizou e cristianizou o tratamento das doenças mentais e psíquicas, influindo nos novos rumos que a medicina tomava nesse sentido.


Alguns espíritas atuais pretendem suprimir a doutrinação, alegando que esta é realizada com mais eficiência pelos Espíritos bons no plano espiritual. Essa é uma prova de ignorância generalizada da Doutrina no próprio meio espírita, pois nela tudo se define em termos de relação e evolução.


Os Espíritos sofredores, que são os obsessores, permanecem mais ligados à Terra e portanto à matéria. Dessa maneira, os Espíritos benevolentes muitas vezes se manifestam nas sessões de desobsessão e servem-se dos médiuns para poderem comunicar-se com os obsessores. Apegados à matéria e à vida terrena, os obsessores necessitam de sentir-se seguros no meio mediúnico, envolvidos nos fluidos e emanações ectoplásmicas da sessão, para poderem conversar de maneira proveitosa com os Espíritos esclarecedores. Basta esse fato, comum nas sessões bem orientadas, para mostrar que a doutrinação humana dos Espíritos desencarnados é uma necessidade.


Os planos espirituais são superpostos. A partir da Terra, constituem as chamadas esferas da tradição espiritualista européia, segundo o esquema da Escala Espírita (O Livro dos Espíritos) como regiões destinadas aos vários graus ou ordens dos Espíritos. Essas esferas ou planos espirituais são mundos que se elevam ao infinito. Quanto mais elevado o mundo, mais distanciado está do nosso mundo carnal. A doutrinação existe em todos os planos, mas o trabalho mais rude e pesado é o que se processa em nosso mundo, onde os Espíritos dos mundos imediatamente superiores vêm colaborar conosco, ajudar-nos e orientar-nos no trabalho doutrinário.


Do livro “Obsessão, o passe, a doutrinação”

J. Herculano Pires - Editora Paidéia


Opiniões Alheias




Se trazes a consciência tranquila, porque te impacientares tanto com as opiniões alheias, desfavoráveis?


Cada pessoa fala daquilo que conhece oferecendo o que seja ou o que tenha.


A suposição dos companheiros, a nosso respeito, nasce daquilo que eles estimariam ou estimam fazer.


Cada qual de nós está no centro das próprias experiências.


Os irmãos que nos cercam são livres para pensarem a nosso respeito, da mesma forma que somos livres para anotar-lhes o comportamento.


Ninguém consegue obrigar determinada pessoa a raciocinar com outro cérebro, a não ser aquele que lhe pertence.


Se um a pessoa se irrita contra nós sem razão, isso não é motivo para que venhamos a comprar uma rixa desnecessária.


Você está diante de uma pessoa encolerizada da mesma forma que você se encontra perante um doente: preste auxílio.


Toleremos os outros, para que os outros nos tolerem.


Hoje, alguém terá perdido a serenidade, à nossa frente; amanhã, possivelmente, seremos nós, em situação igual diante deles.


Emmanuel
(Do livro “Calma” – Chico Xavier)